Diogo Álvares, conhecido como Caramuru, foi um dos primeiros europeus a se estabelecer no litoral do Brasil. Português, sobreviveu a um naufrágio na costa da Bahia, por volta de 1509. Foi acolhido pelos Tupinambás, impressionados com suas armas de fogo — o que teria originado o apelido “Caramuru”, associado ao “homem do trovão”.
Caramuru ganhou a confiança da comunidade indígena e casou-se com Paraguaçu, filha de um líder tupinambá, o que representou uma aliança política e cultural entre portugueses e indígenas. Segundo relatos, Paraguaçu viajou com ele à França e foi batizada como Catarina do Brasil. O episódio, embora questionado por historiadores, consolidou a imagem de Caramuru como mediador entre culturas.
Na Bahia, Caramuru atuou como intérprete, conselheiro e articulador político. Colaborou com Francisco Pereira Coutinho, donatário da capitania da Bahia e, após a morte de Coutinho em 1547, permaneceu influente na região. A data de sua morte não é precisa, mas documentos indicam que ocorreu por volta de 1557, e ele foi sepultado no Mosteiro de São Bento, em Salvador.
A trajetória de Caramuru foi registrada por cronistas como Gabriel Soares de Sousa, Frei Vicente do Salvador e Simão de Vasconcellos. Também inspirou o poema épico Caramuru, escrito por Santa Rita Durão em 1781, que apresenta o personagem como um herói religioso e colonizador. No século XIX, autores românticos passaram a reinterpretar o mito, enfatizando as tensões entre colonização e identidade nacional.
Apesar da imagem de conciliador, sua figura é objeto de controvérsia. O nome Paraguaçu, por exemplo, não aparece em registros contemporâneos e teria sido criado por cronistas do século XVII. Além disso, Caramuru acumulou fortuna com o uso de trabalho escravizado, tanto indígena quanto africano, e sua descendência esteve envolvida no tráfico de pessoas.
Caramuru também atuou em disputas políticas locais. Participou da tentativa de retorno de Coutinho à Bahia e mediou conflitos com a administração de Tomé de Sousa, primeiro governador-geral do Brasil.
O personagem é recorrente na literatura histórica e ficcional. A história de Caramuru foi adaptada e reelaborada ao longo dos séculos, sendo utilizada para justificar tanto a dominação europeia quanto ideais de integração entre culturas.
Hoje, seu nome batiza logradouros em diversas cidades brasileiras, incluindo uma rua no bairro da Chácara Inglesa, em São Paulo.
Referência: TREECE, David. Caramuru, o mito: conquista e conciliação. Tradução de Marcos César de Paula Soares. In: Revista Teresa – Revista de Literatura Brasileira, n. 12/13, São Paulo, 2013, p. 307–344.