Deputado quer alterar nome de quatro rodovias do estado de São Paulo

Não é normal fazer esse tipo de texto e espero que todos tenham educação e respeito para debater e comentar o tema. Ele mexe com os nomes de rodovias que estamos acostumados desde jovens e resolvei trazer a discussão para este espaço histórico. Isso colocado, vamos à notícia.

O deputado Carlos Gianazzi (PSOL) propôs o Projeto de Lei 394/2020 para alterar o nome de quatro rodovias do estado: Raposo Tavares, Anhanguera, Bandeirantes e Castello Branco. A justificativa, segundo o projeto (que está na íntegra, ao final do texto) é a de que:

“Esta propositura busca promover o revisionismo histórico necessário neste momento de tendência mundial de recuperar a memória e a verdade dos fatos ocorridos na formação nacional.

Deste modo, a manutenção de homenagens a personalidades históricas que se destacaram pela perseguição a minorias e pela violência, e que foram mantidas e preservadas pelo temor e pela ameaça, não condizem com as liberdades democráticas pela que passa o Brasil desde a Constituição de 1988″.

Dessa forma, se o projeto for aprovado na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) e sancionado pelo Governador João Dória, as rodovias passariam a ser conhecidas da seguinte forma:

A Rodovia Castello Branco – SP-280 – passa a ser denominada de Carlos Marighella, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a SP-225, em Santa Cruz do Rio Pardo;

A Rodovia Raposo Tavares – SP-270 – passa a ser denominada de Dandara, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a BR-267, em Presidente Epitácio;

A Rodovia Anhanguera – SP-330 – passa a ser denominada de Tupi, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a BR-050, em Igarapava;

A Rodovia dos Bandeirantes – SP-348 – passa a ser denominada de Guarani, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a SP-330, em Coredeirópolis.

Registro da Rodovia dos Bandeirantes que, se tiver seu nome alterado, será chamada Rodovia Guarani

Segundo o site da Alesp, o projeto está distribuído entre várias comissões, como a Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR) e a Comissão de Transportes e Comunicações (CTC).

Abaixo, o texto do Projeto de Lei que está na Alesp.

PROJETO DE LEI Nº 394, DE 2020

Altera a denominação de rodovias estaduais paulistas.

A ASSEMBLEIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECRETA:

Artigo 1º – Ficam alteradas as denominações das seguintes rodovias paulistas:

I- A Rodovia Castello Branco – SP-280 – passa a ser denominada de Carlos Marighella, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a SP-225, em Santa Cruz do Rio Pardo;

II- A Rodovia Raposo Tavares – SP-270 – passa a ser denominada de Dandara, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a BR-267, em Presidente Epitácio;

III- A Rodovia Anhanguera – SP-330 – passa a ser denominada de Tupi, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a BR-050, em Igarapava;

IV- A Rodovia dos Bandeirantes – SP-348 – passa a ser denominada de Guarani, em toda sua extensão, compreendida entre a Capital do Estado de São Paulo e o entroncamento com a SP-330, em Coredeirópolis.

Artigo 2º – Ficam revogados o Decreto nº 48.275, de 21 de julho de 1967, e o Decreto nº 11.555, de 12 de maio de 1978.

Artigo 3º – Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA

Esta propositura busca promover o revisionismo histórico necessário neste momento de tendência mundial de recuperar a memória e a verdade dos fatos ocorridos na formação nacional.

Deste modo, a manutenção de homenagens a personalidades históricas que se destacaram pela perseguição a minorias e pela violência, e que foram mantidas e preservadas pelo temor e pela ameaça, não condizem com as liberdades democráticas pela que passa o Brasil desde a Constituição de 1988.

Temos insistido para a importância de exemplos como o da Espanha, que através da Ley de Memoria Historica determinou a eliminação, em todo o território daquele país, de placas, conjuntos escultóricos e denominações de prédios de referências a personalidades que, durante o período de regime militar agiram, com violência e brutalidade a cidadãos, em frontal violação de direitos humanos.

Já em 2009, com o Decreto Federal nº 7.037, o Brasil aprovou o Programa Nacional de Direito Humanos – PNDH-3, cuja Diretriz 25, objetivo estratégico I, ação programática “c” prevê regras, de abrangência nacional, que proíbam a denominação de prédios e logradouros públicos com nomes de pessoas que tenham praticado crimes de lesa-humanidade, bem como determinar a alteração de nomes que já tenham sido atribuídos.

Estas quatro grandes rodovias paulista, importantes para a pujança social e econômica do Estado, homenageiam personalidades que, historicamente, são reconhecidas como violadoras dos direitos humanos em seu tempo.

Os bandeirantes, sertanistas do período colonial brasileiro, foram os responsáveis pela conquista territorial da América do Sul, realizada em busca de riquezas como ouro e prata, deixando em seu caminho um rastro de escravização dos povos indígenas originários e de extermínio de quilombos.

Dentre os bandeirantes, destacaram-se pelo seu empenho nas explorações de indígenas e metais nobres os outros homenageados com as rodovias:

– Antônio Raposo Tavares, que em sua última missão percorreu cerca de 10 mil quilômetros, de São Paulo ao Paraguai, e de lá até Mato Grosso, Amazonas e Pará; e

– Bartolomeu Bueno da Silva (Anhangüera), que por três anos explorou o cerrado brasileiro, até encontrar minas de ouro nas terras dos índios goyás.

Essas movimentações, sempre, concluíam com a devastação territorial e o extermínio das culturas indígenas.

Por fim, Humberto de Alencar Castello Branco foi o primeiro presidente do regime militar, inaugurado com o golpe de 1964, e que levou ao rompimento democrático, à perseguição, à tortura e à morte dos seus dissidentes. Com seu caráter autoritário e nacionalista, o regime de 21 anos levou ao fechamento do Congresso Nacional, à violação extrema de direitos sociais, civis e políticos e à prisão e morte de qualquer um que contestasse o regime.

Eis, portanto, que esta propositura se justifica, ao buscar assegurar que a realidade histórica seja preservada e resgatada em sua integralidade, excluindo denominações heróicas àqueles que não o foram – ao contrário, estes exemplos demonstram que, com suas ações, essas homenagens arraigam na atualidade paulista personagens que se destacaram pelas violações e agressões individuais e coletivas na formação da identidade nacional.

De outra parte, a reparação se faz com a homenagem das vítimas dessas personalidades:

– Os indígenas Tupi são reconhecidos historicamente como os habitantes da costa brasileira, à época da chegada dos colonizadores europeus, sendo especialmente assim designados os índios habitantes da cidade de São Vicente.

– As etnias Guarani, de sua parte, são conhecidas como uma das mais representativas das Américas, e possuíam como territórios tradicionais a porção centro-meridional do território brasileiro. Os guerreiros (significado da palavra “guarani”) formavam uma população de cerca de 2 milhões no início do século XVI, hoje sendo pouco mais de 50 mil.

– Dandara foi uma guerreira negra do período colonial brasileiro, que dominava técnicas da capoeira e que lutou ao lado de homens e mulheres nas muitas batalhas consequentes aos ataques ao quilombo de Palmares.

Ainda menina se juntou ao grupo de negros que desafiaram o sistema colonial escravista e ali participava, também, da elaboração das estratégias de resistência do quilombo.

Foi esposa de Zumbi dos Palmares, com ele tendo três filhos.

Após ser presa, suicidou-se para não retornar à condição de escrava.

Em 2019, através da Lei nº 13.816, teve seu nome inscrito no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria, depositado no Panteão da Pátria e Liberdade Tancredo Neves, em Brasília.

– Carlos Marighella foi um político, escritos e guerrilheiro brasileiro, um dos principais organizadores da luta armada contra a ditadura militar, chegando a ser considerado o inimigo “número um” do regime.

Já na ditadura da Era Vargas, foi preso por subversão e torturado, ficando encarcerado por um ano. Eleito deputado federal constituinte pelo Partido comunista Brasileiro baiano em 1946, perdendo o mandato em 1948, retornando à clandestinidade.

Fundou o grupo armado Ação Libertadora Nacional (ALN), que em 1969 participou do sequestro do embaixador norte-americano Charles Elbrick, em uma ação conjunta com o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8).

Em 4 de novembro de 1969, foi surpreendido por uma emboscada na alameda Casa Branca, na capital paulista, sendo morto a tiros por agentes do DOPS, em uma ação coordenada pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury.

Assim, portanto, é que justificamos esta propositura.

Sala das Sessões, em 15/6/2020.

a) Carlos Giannazi – PSOL