Contar a história de bairros periféricos ou “pouco” famosos é uma tarefa difícil. E nem sempre os grandes veículos, as grandes mídias vão atrás disso. Nesses casos, a vontade e dedicação de moradores locais são os grandes motores para manter a história dos lugares vivos.

É o caso da Cidade Tiradentes. O texto de hoje é baseado e referendado pelo trabalho de conclusão de curso de Márcio dos Reis, chamado de Formação do Bairro Cidade Tiradentes e apresentado em 2014, na Universidade Camilo Castelo Branco. Deixo o trabalho completo para quem quiser consultar no final. Vamos à história.

A trajetória da Cidade Tiradentes está intimamente ligada à história de Coronel Antônio Prost Rodovalho, proprietário da Fazenda Santa Etelvina. Segundo o livro Evolução Industrial, de Edgard Carone, o Coronel Rodovalho, em 1875, foi nomeado gerente tesoureiro da filial do Banco do Brasil, onde ficou por 12 anos.

Ajudou na fundação do Banco Comercial e também dirigiu a Companhia Estrada de Ferro Ituana e a São Paulo-Rio de Janeiro (futura Central do Brasil). Entre outros negócios, foi um entusiasta da I Exposição Industrial Paulista e teve influência na fundação da Companhia de Gás de São Paulo, da Companhia Cantareira, da Fazenda Caieiras, da Fábrica de Tecidos Anhaia e Cia., da Serraria Sydow, das fábricas de cimento e louça, localizadas no km 83 da Sorocabana (Estação Rodovalho), e da Serraria e Fábrica de Cerâmica, localizadas na Fazenda Santa Etelvina.

Nascido em São Paulo em 1838, ele era filho de Capitão Antônio Joaquim Tavares Rodovalho e Henriqueta Proost Rodovalho. Durante sua vida, Rodovalho foi um importante empresário, mas sua grande sacada foi investir na iluminação de São Paulo.

Pouco antes de 1870, ele viajou para a Inglaterra em busca de investimentos. Voltou com a San Paulo Gas Company Limited, onde investiu muito e se tornou o principal acionista da empresa que, por algum tempo, teve o monopólio da iluminação pública da capital.

Rodovalho, por seu poder e influência, abocanhou vários outros negócios de relevância, como empresa de papel, investimento em estrada de ferro, ajudou na fundação da primeira agência da Caixa Econômica Federal em São Paulo e prestou serviços funerários para a Santa Casa de Misericórdia com exclusividade por 20 anos.

A atual região da Cidade Tiradentes contemplava a fazenda Santa Etelvina, que Rodovalho adquiriu por volta de 1890. Por muito tempo, a fazenda operou como uma verdadeira indústria e, por influência de seu proprietário, chegou a ter um ramal ferroviário para escoar as produções.

Com a forte crise da década de 30, várias empresas de Rodovalho começaram a balançar e dar prejuízo. Rodovalho se tornou, então, um grande fazendeiro. O negócio dele que nos interessa, a fazenda Santa Etelvina, foi cuidadosamente descrita no trabalho que estudamos. Peço licença para usar as palavras do autor:

“No  total  da  fazenda  existia  60  casas  divididas  em  21  aglomerações,  no  máximo de  5  casas  por  aglomeração,  todas  aglomerações  eram  divididas  por  toda  a  fazenda  e numeradas  todas  as  casas,  algumas  casas  eram  de  pau  a  pique  e  outras  de  tijolos  e reboco,  na  média  todas  com  2  quartos  e  algumas  com  3  quartos,  e  nem  todas  com energia  elétrica,  nas  aglomerações  maiores  com  cinco  casas  eram  compostas  de  grandes galinheiros  e  chiqueiros,  e  cada  aglomeração  tinha  uma  cozinha  separada  e  galinheiros  e pequenas  hortas. 

Uma padaria e um armazém foram relacionados  também,  a  fazenda principal  era  composta  de  8  cômodos,  no  jornal  é  mencionado  uma  fazenda  velha,  mais sem muito detalhes. A serraria e a olaria eram  a  vapor  com  dois  fornos  grandes  e  consta  uma fábrica  de  mandioca  e  uma  grande  casa  de  administração  de  empregados  com  uma  linha telefônica.”

(…)

A  fazenda  era  composta  de  mais  de  25  alqueires  e  15  alqueires  de  milho,  e plantações diversas e  já  registrava  2 alqueires de  mata  esgotada  ou terras improdutivas.

Um  fato  curioso  que  o  jornal  menciona  é  um  caminho  que  levava  para  um lugar  chamado  Barro  Branco,  que  continha  um  riacho,  e  algumas  casas,  o  curioso  é  que nos  dias  de  hoje  dentro  do  complexo  habitacional  da  Cidade  Tiradentes  existe  um subdistrito com o nome  de  Barro  Branco.”.

Uma das versões para a decadência da Santa Etelvina fica por conta da morte de Rodovalho. Não encontrei a data exata, mas pouco antes de 1905, quando a fazenda começou a se desmembrar, os trilhos de bonde foram arrancados e os proprietários das terras que, atualmente, compõem Guaianases, tiveram algumas vantagens.

Sabe-se que, em 1905, parte da Fazenda Santa Etelvina foi vendida e, o que restou, chegou a ser doado. Uma parte se tornou o terreno para uma Colônia Agrícola para menores abandonados.

Av. Ragueb Chofhi perto do tobogã. Do lado direito início das obras do Conjunto Santa Etelvina. Foto entre 1989 e 1990

Uma pequena parte da Santa Etelvina se manteve ativa até 1978, quando foi comprada pela Cohab, dando origem aos gigantescos conjuntos habitacionais que existem por ali. Há estimativas de que, atualmente, mais de 250 mil pessoas vivam na região. A memória do local é cuidadosamente preservada em uma página do Facebook muito bem editada, chamada Fotos Antigas da Cidade Tiradentes.

O que sobrou  da fazenda  ainda  existe,  no  terminal  de  ônibus  Cidade  Tiradentes,  a  fazenda  do terminal  não  temos  como  saber  se  é  a  fazenda  nova  ou  velha,  mais  ainda  serve  hoje como ponto de  referência  da  antiga  Fazenda  Santa  Etelvina.

Prédios do Conjunto Santa Etelvina em 1992

Referências: https://documentcloud.adobe.com/link/track?uri=urn%3Aaaid%3Ascds%3AUS%3A5459b132-2fd6-470b-aa51-aa1b149b06d6#pageNum=25

https://www.facebook.com/historiadobairrocidadetiradentes/?ref=page_internal

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